Sobre ética e design(ers)

Um dos blogs de design mais queridos no meu Google Reader é o designices, do Rogério Fratin. Além de fazer resenhas super convidativas sobre apaixonantes livros de design, o cara vez por outra traz uma discussão pertinente à carreira e ao mercado. E um texto recentemente publicado por lá abrange uma temática indispensável na vida de qualquer pessoa, mas que muitas vezes não é devidamente discutida quando falamos sobre o design na comunicação e na criação de produtos: a ética. (Recomendo que você leia aqui antes de continuar)

Me lembro, logo após ingressar no curso de Design de Produtos, de reencontrar amigos da escola e “disputarmos” qual, dentre nós, estava seguindo a profissão mais “importante”.

Era futuro médico dizendo que salva vidas, futuros advogados falando sobre leis e direitos, e eu lembro de ter dito assim: todos vocês querem trabalhar para ter dinheiro, e poder comprar as coisas que nós, designers, projetamos. Na hora nem me dei conta, mas hoje vejo o quanto isso é sério.

Não dá pra dizer que o atual estado das coisas é culpa dessa nossa geração, mas essa nossa geração é quem pode mudar as coisas para um futuro menos consumista, compulsivo e superficial.

Mercado de luxo, onde o design é imprescindível da embalagem à publicidade.

O tão somente uso da palavra “design” em um produto já passa a agregar um valor afetivo a este, de carros a batedeiras, de canetas a eletrônicos.

Não quero entrar no mérito do marketing e da publicidade, mas enquanto designers, vejo a nossa ética exatamente nessa preocupação com o que estamos comunicando. E não é só no design gráfico em peças publicitárias não. A falta de ética no design pode estar também em um produto planejado para durar menos, no uso de materiais pouco resistentes para sua função, ou outro truque qualquer que reduza o tempo de vida útil do objeto em questão. É criar “tendências” de estilos que são ultrapassadas cada vez mais rápido, tornando um celular funcional e útil em um aparelho obsoleto apenas pela troca de uma entrada de carregador.

A ética não pode deixar de ser observada também pelo profissional autônomo/free lancer, desde à proposta de orçamento até a sua relação com os “concorrentes”. Vender um serviço por um preço muito abaixo do mercado não só prejudica o profissional, que não será capaz de gerar lucros (e muitas vezes nem mesmo cobrir os custos), mas também prejudica o mercado, forçando uma queda no valor do design percebido pelos clientes.

E tem uma prática, bem comum inclusive, que muita gente nem percebe como falta de ética: o profissional, ainda sem muita experiência, se passa por cliente e entra em contato com outros profissionais do mercado para descobrir seus preços. Essa prática, além de anti-ética, não é nem um pouco eficiente. Um profissional monta seu preço de acordo não só com o mercado e com sua capacidade e talento, mas também com base nos seus custos operacionais. Se o cara aluga um bom escritório bem localizado, tem equipamentos de ponta, secretária, internet banda larga, conta de energia alta, terceiriza serviço de entrega e faz cursos constantemente, seu preço não pode ser comparado ao de um recém formado que usa o computador da casa e não desembolsa nada para pagar as contas dos recursos que utiliza. Não estou desmerecendo o trabalho do recém formado, é uma questão de custos.

E você, onde acha que a ética não pode faltar?

 

 

 

 

 

 

4 comentários sobre “Sobre ética e design(ers)

  1. Rogerio Fratin disse:

    Tereza, Tereza…
    Que beleza de texto, hein? Muito obrigado pelas menções!
    Olha, vi algumas coisas sobre ética do designer na internet, logo depois que fiz o texto. O que é discutido [e muito bem feito, por sinal] é a ética filosófica, kantiana. Adoro esse tipo de questionamento, mas confesso que sinto falta de discutir o que é aplicado dessa filosofia toda, como você bem fez e exemplificou. Acho muito digno trabalhar com produtos e projetar aqueles que podem fazer diferença na vida de uma pessoa, seja pela usabilidade, seja na economia de tempo que ele pode providenciar, seja pela diversão que traz. Da mesma forma que acho muito interessante trabalhar na divulgação de conhecimento, principalmente com livros, revistas e entretenimento. Acho que meu futuro, para ser o mais ético possível, será trabalhando sozinho, como faz o Marco Moreira, do http://.magelstudio.com.br.
    Lembro que na faculdade um aluno meu falou “Nenhum professor tem carro caro, designer vai morrer de fome”. O valor de vida pro sujeito era o capital, apenas isso. Talvez não fosse suficiente ele ter a visão holística das coisas, nem compreender a linguagem, a estética. Nem entender manobras políticas por conta do design, nem as mudanças econômicas e sociais que o design pode fazer. Uma criança pobre e desmotivada da vida pode ler um texto por causa da “cara” que um designer deu. Será que isso não é legal suficientemente para querer ser designer? E essa coisa de “designer não tem dinheiro”? Não sei que raios que ficam falando disso. Tenho vários amigos designers que saem pra apreciar um bom restaurante, viajam todo ano, moram bem, são cultos, têm muitos amigos, curtem a cidade. Precisa mais? Eu me contento com isso 😉
    Muito bom, Jardim!
    E vâmo que vâmo!
    Beijão,
    Rogério Fratin

    • Tereza Jardim disse:

      Ahhh fico muito feliz com sua passagem por aqui! Mas nem precisa muito esforço pra ser o primeiro não, aqui pouca gente diz a que veio, rsrs… Mas visitas como a sua serão sempre bem vindas.

  2. Marco Moreira disse:

    Como eu SEMPRE chego depois da Tereza Jardim e do Roger em seus respectivos blogs. Faço isso aqui também para manter a tradição..rs
    Depois de ler dois super posts (Designices e este aqui) e ler um comentário super pertinente e claro como o do Roger, faço das palavras dele as minhas.

    Já desabafei lá no Designices a respeito de ética e fui além do que talvez eu deveria ter falado de fato, mas acho que essa discussão precisa ser levada a sério mesmo, pois a falta dela vai empactar na vida das pessoas e de nossos filhos no futuro.

    Bjo Te!

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